Queremos ler! Grande Sertão: Veredas em HQ

22 de março de 2015

post18Quem termina de ler Grande Sertão: Veredas fica, muitas vezes, com um sentimento de estranhamento. A realidade à nossa volta se torna mais mágica e as coisas e as pessoas do nosso dia a dia, de repente, parecem ter outras cores e ser mais profundas do que aparentam.

Se a adaptação da obra de Guimarães Rosa para os quadrinhos, publicada em 2014 pela editora Biblioteca Azul, resultar em metade desse maravilhamento, o crédito seria grande para seus autores: Eloar Guazzelli, responsável pelo roteiro, e Rodrigo Rosa, pelos desenhos.

A narrativa do romance é conhecida. Riobaldo, antigo jagunço, conta, já no fim da vida, a uma pessoa que visita sua fazenda, as reviravoltas que o fizeram se envolver com Zé Bebelo, que pretendia pacificar o sertão, e nas guerras entre os bandos de Hermógenes e Joca Ramiro. Nesse caminho é acompanhado por outro jagunço, Diadorim, por quem tem sentimentos dúbios.

Mistura de faroeste, história de vingança e de amor, Grande Sertão é, acima de tudo, universal. “O diabo na rua, no meio do redemoinho”, frase repetida no romance, remete, entre outras coisas – ao próprio Diabo é uma delas -, à condição essencial do homem: tudo é incerto na vida e todos morremos.

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Já a linguagem utilizada por Guimarães Rosa não é fácil nem de ser descrita: muito embora remeta à forma de falar dos habitantes do sertão nordestino, não é, apenas, uma transposição desse falar. Rosa faz inúmeras adaptações, incluindo construções morfológicas suas e inserção de palavras de outras línguas.

Por todas essas qualidades, não foi pequeno o desafio da dupla responsável pela graphic novel. Afinal, transpor todos esses significados (ou boa parte deles) para a combinação de desenho e texto da nova mídia não é tarefa fácil.

Surrealismo – Se no caso das cenas de ação, a ‘ajuda’ dos desenhos pode contribuir para o entendimento da história, naquelas onde o que acontece no romance é ambíguo, não. É o caso do famoso episódio do pacto de Riobaldo com o Diabo, no qual até o protagonista não sabe se o acordo foi, de fato, feito. Aqui, como o desenho realista não ajuda a transmitir todas as significações que Rosa imprimiu ao texto, a solução encontrada pelo ilustrador Rodrigo Rosa, como se pode perceber na imagem de divulgação abaixo, foi acrescentar alguma transgressão surrealista.

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Rodrigo, aliás, já fez a arte de outras adaptações para as histórias em quadrinhos de clássicos literários, como Os sertões, O cortiço e A Ilíada.

Guazzelli, que cuida do roteiro e é também diretor de animações, Ilustrador e artista plástico, da mesma forma adaptou para os quadrinhos textos famosos, como O pagador de promessas, Escrava Isaura e O bem amado.

Grande Sertão: Veredas – Graphic novel
Autor: João Guimarães Rosa
Roteiro: Eloar Guazzelli
Arte: Rodrigo Rosa
Editora: Biblioteca Azul

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